O percentual de pessoas obesas em idade adulta no país mais do que dobrou em 17 anos, indo de 12,2%, entre 2002 e 2003, para 26,8%, em 2019. No mesmo período, a proporção da população adulta com excesso de peso passou de 43,3% para 61,7%, representando quase dois terços dos brasileiros. Os dados são do segundo volume da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2019, divulgada hoje (21) pelo IBGE, e que é uma parceria com o Ministério da Saúde.
A comparação foi feita com as edições 2002-2003 e 2008-2009 da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) e com edição anterior da PNS, em 2013, para as pessoas com 20 anos ou mais de idade. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a avaliação antropométrica nutricional de adultos deve ser feita a partir da relação entre peso e altura. Para a OMS, quem tem o Índice de Massa Corporal (IMC) abaixo de 18,5 kg/m² pode ser classificado com déficit de peso. Já os que têm o IMC igual ou acima de 25kg/m² podem ter excesso de peso e, igual ou acima de 30 kg/m², obesidade.
Segundo a técnica do IBGE Flávia Vinhaes, os dados da PNS retratam o avanço do excesso de peso e da obesidade na população brasileira nos últimos anos. “O percentual tanto da obesidade quanto do excesso do peso vem subindo. Em ambos os sexos, o excesso de peso avançou e a obesidade mais que dobrou”, diz a pesquisadora.
Considerando o grupo com 18 anos ou mais, 25,9% estavam obesos em 2019, o que representa 41,2 milhões de pessoas. Cerca de 96 milhões de pessoas, ou 60,3% da população nesse grupo etário, estavam com excesso de peso. “A obesidade é um subgrupo do excesso de peso, então as pessoas obesas também estão inclusas no grupo que está com excesso de peso”, explica Flávia.
O estudo também investigou as medidas antropométricas de adolescentes entre 15 e 17 anos que foram selecionados em uma subamostra dos domicílios da pesquisa. O percentual de excesso de peso para os adolescentes desse grupo foi de 19,4%, o que representa 1,8 milhão de pessoas. A prevalência foi maior entre adolescentes do sexo feminino (22,9%) do que no masculino (16%). Em relação à obesidade, o percentual ficou em 6,7%, sendo 8% para o sexo feminino, e 5,4% no sexo masculino.
Cerca de 7,4 milhões de pessoas (33,7%) de 18 a 24 anos estavam com excesso de peso em 2019. Já quando se observa o grupo da faixa de idade entre 40 e 59 anos, essa prevalência sobe para 70,3%, o que representa 39,5 milhões de pessoas.
“Com o avanço dos grupos de idade, a prevalência vai aumentando, mas ela diminui na faixa de idade de 60 anos ou mais. Isso para ambos os sexos. A gente observa que as mulheres têm mais prevalência que os homens em excesso de peso, exceto na faixa de 25 a 39 anos, em que os homens têm o percentual mais elevado”, diz a pesquisadora. Em 2019, a obesidade atingia 29,5% das mulheres e 21,8% dos homens, enquanto o sobrepeso afetava 62,6% das mulheres e 57,5% dos homens.
A técnica destaca que a obesidade cresce conforme o avanço das faixas de idade, exceto no grupo de pessoas com 60 anos ou mais. “Em relação à obesidade, a gente observa esse mesmo movimento, à medida que a idade vai avançando, a prevalência aumenta. Na faixa de idade de 60 ou mais, o percentual recua. Observamos também que as mulheres têm maior prevalência de obesidade que os homens em todos os grupos de idade”, completa.
A pesquisa também analisou o déficit de peso na população brasileira. O déficit de peso no grupo de pessoas com 18 anos ou mais foi de 1,6% em 2019. “A interpretação de déficit de peso é que abaixo de 5% seriam características normais de uma população. Se tivermos um percentual abaixo disso, não é caracterizado como déficit, mas como característica de pessoas que têm o biotipo magro”, explica a pesquisadora.
A prevalência de déficit de peso foi maior entre os homens em quase todos os grupos de idade, exceto entre as pessoas de 60 anos ou mais. O percentual de déficit de peso das mulheres desse grupo ficou em 2,9%, enquanto o dos homens foi de 2,2%.
Atenção Primária à Saúde é avaliada com nota 5,9
Pela primeira vez, a PNS abordou o tema Atenção Primária à Saúde (APS). O público-alvo do estudo foram moradores com 18 anos ou mais que tiveram pelo menos dois atendimentos com o mesmo médico em Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou Unidades de Saúde da Família (USF). As respostas deles a um questionário foram usadas para calcular o Escore Geral da APS, que varia de 0 a 10. No Brasil, o escore obtido foi de 5,9.
“Sempre que o escore médio é acima de 6,6, ou seja, dois terços de 10, você diz que aquele serviço tem uma orientação para ser de qualidade. É um ponto de corte. Se você tem um valor abaixo disso, não quer dizer que você está muito distante dessa qualidade. Com 5,9, eu diria que o Brasil está em uma trajetória de qualidade para esse público-alvo”, explica o professor associado da Faculdade de Medicina da UFRJ, Luiz Felipe Pinto, que foi consultor da pesquisa.
O estudo também investigou características como sexo, grupos de idade, cor ou raça e estado conjugal dos usuários de Atenção Primária à Saúde. Das pessoas que utilizaram alguns dos serviços da APS nos últimos seis meses que antecederam a entrevista, 69,9% eram mulheres, 60,9% eram pretas ou pardas, 65% tinham cônjuges e 35,8% estavam entre 40 e 59 anos.
De acordo com o diretor substituto do Departamento de Saúde da Família, da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, Alexandre Fortes, os motivos que levaram ao aumento da prevalência de obesidade e excesso de peso na população brasileira podem ser compreendidos a partir dos dados que serão divulgados no próximo volume da PNS. “A parte de antropometria nos mostrou que há uma grande parcela da população aquém do desejado. Os índices alarmaram um pouco e os motivos da obesidade podem ser vários. Com o módulo de hábitos de saúde, que, de certa forma, é correlacionado com os hábitos alimentares, vamos ter dados para nos fazer entender por que os dados da antropometria terem sido como foram”, afirma.
O professor da USP Wolney Conde, que foi consultor da pesquisa, afirma que o avanço da obesidade no país é preocupante e que mudanças devem ser feitas no combate à doença. “De maneira geral, se a gente separar os determinantes da obesidade no Brasil e de outros países, em determinantes individuais e sociais, de maneira mais ampla, a gente vai ver que boa parte das ações de prevenção, de combate à obesidade, tem se concentrado naqueles determinantes individuais. É importante que a gente tenha uma mudança enfática em relação a isso. Sem um combate mais centrado em determinantes sociais do crescimento da obesidade, dificilmente vamos conseguir muito sucesso”, analisa.
“As causas individuais são aquelas que o indivíduo tem que eleger para sua saúde: se ele pratica atividade física, se ele se cuida, o que ele escolher comer, entre outras. Já as causas sociais são as condições de sobrevida, são a renda, tempo de lazer, as condições de mercado que ele enfrenta para fazer essas opções individuais. Então basicamente quando a gente centra nossas campanhas de prevenção em aspectos individuais, a gente está incentivando e empoderando o indivíduo, mas atuando pouco, de maneira geral, nas causas estruturais”, completa o professor.
Fonte: Agência IBGE