Especialistas se reúnem em mesa digital para debater renovação do Decreto do SAC na Era do Diálogo

 

O novo decreto que estabelece novas normas para o SAC está prestes a valer. A minuta, que já saiu da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) para consultoria jurídica do Ministério da Justiça agora caminha pelo Ministério da Casa Civil, e deve ser finalmente sancionada em agosto.

Evoluções e novas garantias referentes ao atendimento têm muito a ver com a pandemia, que forçou uma digitalização em massa e demandou a revisão do decreto que teve sua última grande revisão em 2008. Dessa vez, o texto garante serviço de atendimento ao consumidor sempre gratuito, além da obrigatoriedade da opção de atendimento telefônico.

Para entender o comportamento do cliente omnicanal e como colocar a cultura CX nas empresas para fazer valer regras como estas e outras, o evento promovido pelo Grupo Padrão para resolutividade e defesa do consumidor a Era do Diálogo chamou especialistas no assunto para a mesa virtual “O que está em jogo na revisão do decreto dos SACs? Impactos e oportunidades”.

O debate com a ouvidora do Banco Santander, Monique Bernardes, o diretor de atendimento a clientes da Claro, Celso Tonet, a diretora do Mercado Brasil (Enel Brasil), Marcia Sandra Roque Vieira Silva, e o chefe de gabinete do Procon-SP, Guilherme Farid Mischi Bou Chebl, tratou do aprimoramento do atendimento ao consumidor sem perder qualidade e contato humano, além dos atuais gargalos dos serviços e seus possíveis melhores indicadores de aprimoramento.

O head do portal O Consumerista e editor de Consumo e Economia da Consumidor Moderno, Ivan Ventura, foi o mediador da conversa.

 

Uma virada de chave a favor do consumidor

Repensar o decreto do SAC é uma necessidade quando diante da digitalização, ainda mais quando este prestigia mais o atendimento digital que o telefônico. Guilherme Farid chama a atenção para as limitações e públicos neste sentido, já que há, na visão dele, uma transição de gerações, com as mais antigas eventualmente com alguma dificuldade com tecnologias.

“Fazendo uma análise muito geral, acredito que o decreto do SAQ avança em um sentido importante — que é de digitalizar e informar, que vai permitir um registro e resolução mais rápida do problema — mas não podemos esquecer do público que necessita de um atendimento telefônico. O que a Fundação Procon espera é que essa virada de chave não prejudique o consumidor que faz sua transação por telefone. Não podemos esquecer que há diversos motivos, como as pessoas que não têm acesso — esse País é grande demais. Aqui em São Paulo não se discute algumas coisas como no Norte e Nordeste do País, como acesso à internet 3G. Mesmo com o acesso, determinados públicos são enquadrados no que o Código de Defesa do Consumidor traz como os ‘vulneráveis tecnológicos’. E não se pode fechar as portas para este público. Então, eu olho para a nova minuta com otimismo, mas fico um pouco cético em relação à efetiva implementação e como ela vai se dar”, alerta o especialista.

 

Resolutividade como nova meta

Os especialistas concordam que houve uma nítida evolução no histórico do atendimento no Brasil, ainda que os números também indiquem que há muito o que melhorar no atendimento. De acordo com eles, hoje o maior desafio passa a ser a resolutividade.

“Mas vale um comparativo sobre a realidade que vivemos hoje e a situação em 2008 — quandohouve o lançamento do Decreto SAC pela primeira vez. Tínhamos um grande desafio era dar acesso ao cliente para conseguir falar com as empresas. Esse propósito foi cumprido ao longo dos anos. Vemos queda significativa nas reclamações nos canais em relação ao falar com a operadora. Já não temos mais o problema de falar com as empresas”, lembra Celso Tonet. “Aqui na Claro pautamos o trabalho em quatro dimensões: o acesso, a resolução — que é a crítica do momento -, a confiança e o engajamento.”

Para o diretor da Claro, não adianta expandir canais digitais sem que se resolva o problema do cliente. “Se ele vai resolver numa URA, em um app, no Whatsapp, o atendimento tem que estar disponível o tempo topo, e, ao conseguir falar, tem que resolver o problema. E ao terminar a ligação, ele tem que ter a confiança de que o problema está sendo cuidado. Ele não tem que ficar entrando no app para ficar vendo o andamento do processo. E por fim, ele tem que ter a possibilidade de falar de uma forma mais agradável”, explica o executivo. “O desafio da empresa é engajar o cliente pelos canais, mostrando que ele pode resolver de forma agradável, rápida e simples, que é o que todo mundo espera hoje.”

Na mesma linha, Monique Bernardes reconhece a evolução do decreto com seu foco na transacionalidade no passado e o desafio da resolutividade hoje. Para ela, as empresas precisam mostrar acolhimento. “No momento que precisamos resolver um problema, precisamos do telefone. É o acolhimento. Ele precisa falar ao telefone. Acredito que daqui dois anos estaremos falando de outro momento, mas ainda precisamos levar os canais digitais com coisas simples. Eu não preciso falar com uma pessoa para uma fatura, mas terão pessoas que não vão entender o lançamento e precisarão falar com um humano”, exemplifica.

“Temos que nos preocupar com a capacidade da resolutividade. Ela que vai fazer o ‘decreto pegar’. Acredito na capacidade dos nossos SAQs de atendimento. É que o volume de atendimento é gigante. O volume de solução que temos nos canais é importante. Mas aquilo que não dá certo também é um volume expressivo. O nosso consumidor ainda duvida às vezes que a gente está resolvendo de fato o problema dele. Então, passar a confiança ao consumidor é fundamental.”

 

Equilíbrio e disponibilidade digital humanizada

Marcia Sandra comenta que a minuta abre um leque de oportunidades para as empresas equilibrarem os serviços disponíveis no físico e digital, podendo reforçar o que traz de forma remota.

“Houve um avanço muito forte da escolha do cliente pelo canal digital. O call center hoje, no grupo Enel, corresponde a 11%. Temos uma volumetria muito grande de 5% no atendimento digital, fechando 2020 com 85%. Essa transição é a escolha do cliente. E ao cliente que não habilidade digital, abrimos o Whatsapp. Temos os bots, mas também o humano para dar esse período transitório de aprendizagem do cliente. São canais que seriam digitais, mas são humanos. Isso vai permanecer, sem dúvida. Mas tem que manter os outros canais — e isso é considerado com todo o cuidado na nova minuta. Estamos atentos aos dois mundos — o digital, que esperamos que o cliente aprove e perceba a fluidez, mas mantendo nossos canais. O omnicanal chega para que consigamos atender com todos os canais.”

 

Os bons indicadores

Perguntados sobre os melhores indicadores para o atendimento após sanção do decreto, os especialistas apontaram o Consumidor.gov e a esperada queda nos números dos órgãos fiscalizadores como os melhores termômetros.

Monique Bernardes frisa que registrar as aberturas de espaço para esclarecer procedimentos ao cliente tende a ajudar na visão sobre as quedas de reclamações, ao passo que informar sobre o tempo e envolvimento de terceiros na resolução também pode ajudar a enxergar melhoras.

“Já temos uma referência muito boa que é o Consumidor.gov. Todo mundo vai ter essa ‘final’: ‘foi resolvido o problema na visão do cliente?’. E obviamente temos aqui nas centrais a ‘resolutividade na hora’, o ‘first call resolution’. E o first call pode ser um ‘não’, mas esclarecedor, acolhedor e dando alternativa. Muitas vezes, o cliente chega com uma reclamação, mas que é uma dúvida. Vou dar um exemplo que acontece muito aqui no Santander: temos classificação das empresas com nome fantasia. Você olha a fatura 15, 20 dias depois e não lembra e liga para reclamar. A gente fala de onde é. Isso é muito comum. Você esclarece e resolve na hora ao consumidor. Então, como referência temos o Consumidor.gov e o first call. Tem problemas que são de difíceis solução, como quando a gente envolve um agente externo, como um Detran, por exemplo.”

“Na pandemia tivemos casos de 45 dias para baixa de gravame. Para quem quer vender, isso é uma eternidade. Depende de cartório para crédito imobiliário. Isso tudo tem que contar. O decreto traz isso, entendendo esse tempo de resolutividade. Mas reforço: mesmo que demore um pouco mais, isso tem que ser combinado com o consumidor. Ele tem que saber que a gente está junto com ele, somos um agente de resolução. Temos que falar, mandar mensagem e estar próximo. Por isso, resolutividade e pesquisa de satisfação serão comuns a todos.”

Para Celso Tonet, também cita o Consumidor.gov. “Fortalecendo canais como ele, vamos fortalecer nossa resolução junto ao cliente. O indicador é a própria queda no volume de reclamações. Temos que ser simples, rápidos e fáceis ao cliente. Para isso, temos que fortalecer os canais que sugerem para termos uma forma única e centralizada para agir na causa do que não é resolvido aos clientes.”

Guilherme Farid ressalta que, apesar do Consumidor.gov ser importante, a verdadeira ação está nas empresas, já que o decreto serve mais como direcionamento. “O Procon-SP vai lançar, no segundo semestre, o Procon Números, onde vamos trazer dados de atendimento, resolutividade, individualização por setor e tipo de problema.

Boa parte das reclamações que hoje chegaram ao Procon chega pelo SAQ e canais das empresas. Acho difícil pensar política pública na caneta. Uma nova minuta vai resolver? Ela vai dar uma direção. Mas o trabalho de resolutividade está relacionado ao empenho da empresa em resolver o problema. Aqui no Procon vemos um grupo de empresas que tem muita responsabilidade com o atendimento, com a diretoria de atendimento visitando semanalmente, tratando com os técnicos. O Procon tem começado a dar feedback para e empresa no que ela precisa melhorar para elevar seu atendimento. Se as empresas não conseguirem encontrar um caminho de dar um atendimento rápido, tenha certeza que essa reclamação vai desaguar no Procon, pois digitalizamos ele todo”, prevê o especialista.

 

Fonte: https://www.consumidormoderno.com.br/2021/07/27/decreto-sac-renovacao/