Órgãos públicos podem emitir precatórios e RPVs parciais quando não cabe discutir parte da dívida
O STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu que órgãos do poder público, quando processados na Justiça, podem antecipar o pagamento de parte da dívida sobre a qual não cabe discussão.
Essa antecipação vale para casos em que os recursos apresentados por representantes do governo (municipal, estadual ou federal) contestam apenas parte do direito exigido pelo cidadão. Desta forma, aquilo que não é alvo do recurso gera um valor incontroverso.
Com essa decisão, o Supremo afirmou que a Constituição permite o fracionamento de ordens judiciais de pagamento para a liberação antecipada de valores incontroversos.
O principal efeito desse julgamento deverá beneficiar segurados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) que obtiverem revisões e concessões de aposentadorias, pensões e auxílios na Justiça Federal.
Precatórios e RPVs (Requisições de Pequenos Valores) podem, portanto, ser emitidos em duas etapas: a primeira para pagar atrasados considerados incontroversos e a segunda para, em caso de vitória do segurado, liquidar a dívida.
“Dentro de um Judiciário lento, especialmente nas causas previdenciárias, em que o INSS usa o recurso como forma de atrasar os pagamentos, essa decisão dá segurança e permite receber a parte incontroversa de forma mais rápida”, afirma o advogado Rômulo Saraiva.
Entre as situações em que essa liberação é benéfica para o segurado está o caso em que há discussão sobre o período de atrasados devidos. Isso ocorre quando o cidadão reclama que o direito teve início antes da data estipulada pelo INSS.
Nesse caso, há um período em que as duas partes (segurado e INSS) concordam que há o direito. Por não haver discussão, é constitucional que o cidadão receba essa parte dos atrasados.
Outro exemplo frequente de valor incontroverso, segundo Saraiva, é quanto ao direito do credor de receber juros de mora e correção monetária.
Embora a aplicação da decisão aos processos previdenciários federais seja relevante, já que o INSS é o principal alvo de ações judiciais contra o governo, a interpretação do Supremo também vale para ações contra prefeituras e governos estaduais.
O caso julgado, por exemplo, é uma ação envolvendo o DER (Departamento de Estradas de Rodagem do Governo do Estado de São Paulo).
No processo, o governo paulista sustentava que não era legal fracionar a ordem de pagamento para pagar a parte dos atrasados sobre a qual não caberia mais discussão.
Por ser uma questão que envolve a Constituição, o caso chegou ao Supremo, que foi unânime em aceitar a liberação da parte incontroversa.
Veja a tese firmada com a conclusão do plenário virtual na última sexta-feira (5) para julgamento do mérito do Recurso Extraordinário 1.205.530:
"Surge constitucional expedição de precatório ou requisição de pequeno valor para pagamento da parte incontroversa e autônoma do pronunciamento judicial, transitado em julgado, observada a importância total executada para efeitos de dimensionamento como obrigação de pequeno valor."
DÍVIDA DO GOVERNO | VALOR INCONTROVERSO
Em uma ação judicial envolvendo valores, quando as duas partes concordam que uma quantia do que é cobrado está correta, esse valor é chamado de incontroverso.
No caso do processos do INSS, se o órgão não contesta pelo menos uma parte do valor dos atrasados cobrados pelo segurado, essa é a parte incontroversa.
Exemplo:
O INSS diz que o segurado tem direito a R$ 60 mil, dívida relativa a três anos de valores atrasados
Mas o segurado afirma que a dívida é de R$ 80 mil, pois ele tem direito a quatro anos de atrasados
Os três anos de atrasados (R$ 60 mil) são incontroversos e, portanto, podem ser pagos ao cidadão
E o restante?
A ação prossegue na Justiça até o trânsito em julgado e a conclusão dos cálculos judiciais. Se houver direito, o segurado poderá receber o restante da dívida
Entenda os atrasados
Valores devidos na Justiça por órgãos públicos são quitados por meio de ordens de pagamento que podem levar meses ou até anos para serem emitidas.
No caso dos órgãos e autarquias do governo federal, essas ordens para pagamento de dívida judicial são chamadas de precatórios ou de RPVs .
Precatórios
São os títulos de dívidas judiciais da União que passam de 60 salários mínimos
O repasse dos valores para pagamento de precatórios ocorre só uma vez por ano
Tem direito de receber precatório federal em 2020 quem teve o pagamento autorizado entre 2 de julho de 2018 e 1º de julho de 2019
Prazo
Oficialmente, o Tesouro Nacional tem até o final deste ano para repassar o dinheiro para a Justiça realizar os pagamentos
Tradicionalmente, o governo costuma liberar esses recursos, estimados em cerca de R$ 10 bilhões, entre março e abril
Neste ano, porém, devido à crise gerada pela pandemia do novo coronavírus, o governo ainda não pagou os precatórios
RPV (Requisição de Pequenos Valores)
É o nome do título da dívida judicial limitada a 60 salários mínimos (R$ 62.700, neste ano)
O depósito é realizado na conta judicial do segurado no mês seguinte à autuação
COMO FAZER A CONSULTA
Processos contra o INSS que avançam à segunda instância têm um advogado ou defensor público responsável. A principal dica é manter contato com esse profissional
Também é possível obter informações pela internet, na página do Tribunal Regional Federal responsável pela localidade onde o segurado iniciou a ação
Quem iniciou o processo no estado de São Paulo, por exemplo, deve fazer a consulta no site do TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região): www.trf3.jus.br
Precatório ou RPV?
Ao fazer a consulta no site do TRF, procure por “requisições de pagamentos” e informe o CPF no local indicado
Na página com as informações do seu atrasado, observe o campo “Procedimento”
Se aparecer PRC, significa que a dívida supera 60 salários mínimos e é um precatório
Já a dívida inferior a 60 salários mínimos estará identificada pela sigla RPV
Como saber se minha RPV está no lote de maio?
Em “Data protocolo TRF”, a data deve ser referente a abril de 2020
O campo “Situação da requisição” terá a informação: “PAGTO TOTAL - Informado ao Juízo”
Fontes: Ministério da Economia, CJF (Conselho da Justiça Federal) e STF (Supremo Tribunal Federal)