Grupo ligado à USP prevê 10,3 mil mortes extras com flexibilização até início de julho

 

O relaxamento da quarentena no estado de São Paulo poderá provocar um aumento de 71% no número de mortes causadas pela Covid-19 no estado até o início de julho, de acordo com projeções de um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Fundação Getúlio Vargas (FGV).

 

As medidas de distanciamento social adotadas para conter a transmissão do coronavírus começaram a ser relaxadas em São Paulo na primeira semana deste mês, quando o número total de mortes provocadas pela pandemia alcançou 9.100 no estado, um quarto do total de óbitos notificados no Brasil —neste fim de semana (13 e 14) elas superaram 10.500.

 

Segundo os cálculos do grupo, haveria mais 5.500 mil mortes em São Paulo até a primeira semana de julho se não houvesse relaxamento da quarentena e o grau moderado de adesão da população às medidas de distanciamento social fosse mantido nos níveis de maio, ajudando a frear a evolução do contágio.

 

Em outro cenário, com a reabertura gradual do comércio e as outras medidas de flexibilização, haveria, além das 5.500, mais 10.300 mortes até a primeira semana de julho, por causa do aumento da velocidade da propagação do vírus.

 

O total de mortes notificadas no estado alcançaria, assim, 24.900, dizem os pesquisadores. É uma diferença de 71% sobre os 14.600 óbitos que eles preveem que ocorreriam até o início de julho sem a reabertura.

 

Ao anunciar seu plano para saída da quarentena no estado, o governador João Doria (PSDB) afirmou que as medidas de distanciamento adotadas em março haviam contido o avanço do coronavírus e evitado o colapso do sistema de saúde, o que permitiria a retomada de atividades em vários setores.

 

Mas especialistas consideraram a decisão prematura, por causa da falta de sinais seguros de que o estado conseguiu controlar a transmissão da Covid-19. "É muito arriscado flexibilizar a quarentena com tantas incertezas", diz a cientista política Lorena Barberia, professora da USP e coordenadora do grupo.

 

Os pesquisadores examinaram a evolução do contágio em Goiás, um dos primeiros estados a adotar medidas rigorosas de distanciamento social e um dos primeiros a afrouxá-las, e depois fizeram simulações para entender o que aconteceria se o mesmo padrão observado em Goiás se repetisse em São Paulo.

 

O estado foi escolhido para a comparação porque outros não adotaram medidas tão drásticas no início da quarentena, ou só começaram a flexibilizá-las recentemente, o que torna mais difícil avaliar seu impacto sobre a transmissão do coronavírus e a evolução do número de mortes causadas pela Covid-19.

 

Em Goiás, onde até indústrias foram fechadas por decreto no início da pandemia, o relaxamento das medidas de distanciamento social teve início em 19 de abril e foram registradas 173 mortes em maio. Se as medidas tivessem sido mantidas, 63 mortes teriam ocorrido nesse mês, dizem os pesquisadores.

 

Na avaliação do grupo, as estimativas feitas para São Paulo podem ser consideradas conservadoras, porque a população do estado é muito maior do que a de Goiás, bem como sua densidade populacional e sua taxa de urbanização, fatores que podem contribuir para facilitar a transmissão do coronavírus.

 

As projeções apontam também um aumento do número de mortes causadas por Síndrome Respiratória Aguda Grave, classificação que pode ter sido usada para registrar muitos casos de Covid-19 por causa da falta de testes suficientes para detectar a presença do coronavírus, segundo especialistas.

 

O relaxamento da quarentena poderá provocar um aumento de 22% do número de mortes associadas à síndrome em São Paulo, com o registro de mais 4.200 casos até a primeira semana de julho, de acordo com os pesquisadores, que analisaram dados dos governos estaduais e do Ministério da Saúde.

 

"Mesmo se as medidas de distanciamento social fosse mantidas em São Paulo neste mês, teríamos um número muito significativo de mortes no estado", afirma Barberia. "Isso mostra que seria necessário refletir sobre as consequências das medidas tomadas até aqui, em vez de flexibilizá-las tão cedo."

 

O grupo coordenado por Barberia faz parte da Rede de Pesquisa Solidária, iniciativa que reúne dezenas de pesquisadores de instituições públicas e privadas. A rede tem produzido boletins semanais com os resultados de seus estudos, que estão disponíveis no site da iniciativa.

 

Fonte: Folha de SP