Alvo de um episódio que causou revolta pelo racismo explícito em setembro de 2018, quando foi algemada durante uma audiência enquanto tentava ter acesso à peça de uma cliente, Valéria Lúcia dos Santos afirma “que o Brasil é um país machista”, onde “a mulher não tem muito poder de fala”; “A mulher negra sempre será subjugada. Só queremos respeito para exercermos nosso trabalho”, reivindica; assista

 

Alvo de um episódio que causou revolta pelo racismo explícito em setembro de 2018, a advogada Valéria Lúcia dos Santos, algemada enquanto protestava por não conseguir exercer sua profissão no 3º Juizado Especial Cível em Duque de Caxias, Rio de Janeiro, reivindica em entrevista à TV 247 apenas respeito para exercer seu trabalho.

Na ocasião, ela defendia uma cliente que tinha sido cobrada indevidamente por uma companhia telefônica. Meses após o ocorrido, ela expõe “que o Brasil é um país machista”, onde “a mulher não tem muito poder de fala”. “A mulher negra sempre será subjugada. Só queremos respeito para exercermos nosso trabalho”, reivindica.

Entenda como tudo ocorreu

Três vídeos que viralizaram nas redes sociais mostram a sequência de abusos. No primeiro deles, a advogada está sentada na sala de audiência ao lado de sua cliente e diz à juíza Leiga Ethel de Vasconcelos que só vai se retirar quando chegar o representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Leiga diz que a audiência já havia terminado e que ela deveria esperar do lado de fora. Valéria mantém sua posição e a juíza afirma que vai chamar a polícia. Valéria, então, fica em pé e questiona a decisão de expulsá-la da sala. Ela afirma que tem o direito a “ler a contestação e impugnar os pontos da contestação do réu”. “Isso está na lei. Não estou falando nada absurdo”, defendeu a advogada.

Na sequência, os policiais chegam ao recinto e algemam Valéria. A advogada repete que está trabalhando e que tem direito a isso, como mulher e negra. “Eu quero exercer meu direito de trabalho. É o meu direito”.

“Violações”

Ao relembrar o episódio na conversa com o 247, ela diz que nunca se sentiu respeitada “nos espaços ao exercer sua profissão” e que “uma série de arbitrariedades ocorreram naquela audiência”.

“A gota d’água foi quando eu tive que exercer meu ofício e abrir uma peça processual que já estava anexada aos autos”. “Queria apenas ter acesso à peça de contestação. Não sei por qual motivo, o acesso foi negado”, relata.

Valéria então diz que a única ação que restou foi “pela resistência” perante a situação que ela e sua cliente foram expostas. “A gente observa que várias violações ocorrem no Brasil, por isso não teria outra forma de agir naquele momento”, explica.

Consequências 

Após o episódio, a advogada revela que contou com o apoio da OAB, do movimento negro, de mulheres e também de jornalistas.

No entanto, ela relata que o Tribunal do Rio de Janeiro “apurou que não houve nenhuma arbitrariedade por parte da juíza”. “O tribunal é corporativista. Ocorreram violações, sim”, salienta.

A advogada agora aguarda os trâmites de um recurso da OAB que encontra-se sob análise do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Dois pesos, duas medidas

Valéria avalia ainda como a Justiça brasileira dá tratamentos distintos aos seus membros e cita como exemplo o atual ministro da Justiça, Sérgio Moro. “Ele nunca deveria ter liberado o áudio que gravou os ex-presidentes Lula e Dilma”. “Não tinha respaldo algum ali para ele agir daquela forma, mas ele nunca foi punido por isso”, reflete.

Fonte: Gelédes