A reforma trabalhista, em vigor desde 2017, poderá ser novamente analisada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). O Brasil foi incluído em uma lista preliminar com 40 casos suspeitos de violação de direitos trabalhistas. Após negociações, será elaborada uma relação menor, com 24 casos, que será levada para exame da Comissão de Aplicação de Normas durante a Conferência Internacional do Trabalho, marcada para ser iniciada no dia 10.

 

O que mais chamou a atenção dos peritos independentes na OIT foi a previsão de que o negociado entre sindicatos e empresas deve prevalecer sobre o legislado. Ainda não se sabe se o Brasil estará nessa lista ou se os argumentos já apresentados serão suficientes para não incluir o país, o que deve ser divulgado na próxima semana. Mas caso esteja, representantes do governo, das empresas e dos trabalhadores serão ouvidos na conferência.

 

Em um relatório preliminar, os peritos entenderam que os artigos 611-A e 611-B, incluídos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), violam os princípios básicos do direito internacional do trabalho. Para eles, normas só podem ser alteradas para serem mais benéficas ao trabalhador.

 

No ano passado, pela primeira vez em vários anos, o Brasil entrou na lista restrita de suspeitos. Os peritos acolheram uma queixa dos sindicatos, sobre essa mesma previsão. Para os trabalhadores, ela fere direitos definidos na Convenção 98 da OIT, que trata de negociação coletiva.

 

Na ocasião, o governo brasileiro argumentou que a OIT não podia examinar uma lei que ainda estava sendo implementada, o que foi reconhecido pela Comissão de Aplicação de Normas. Ela também considerou que a Convenção 98 não estava no Ciclo de Consultas do ano.

 

Para a gerente-executiva de Relações do Trabalho da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Sylvia Lorena, não há fundamento para levar o tema à OIT novamente, uma vez que ano passado a Comissão de Aplicação de Normas não indicou qualquer incompatibilidade do artigo 611 com o que traz a Convenção 98.

 

Ela lembra ainda que, das mais de 20 ações que tratam da lei da reforma trabalhista (nº 13467, de 2017) no Supremo Tribunal Federal (STF), nenhuma questiona a previsão que trata da prevalência do negociado sobre o legislado.

 

A investida internacional contra a reforma, acrescenta Sylvia, não tem respaldo nos tratados internacionais. "Não levaram nenhum caso concreto com supostas violações para serem analisados na OIT. Seria inédita uma interpretação do órgão de que uma negociação tem que sempre dar benefícios ao trabalhador. Nunca foi aplicada a nenhum dos 165 países signatários", diz. "As negociações servem para fazer ajustes. Pode tirar alguma vantagem e de outro lado oferecer uma contrapartida."

 

Se o Brasil estiver novamente na lista restrita e tiver seu caso analisado, após as falas das partes envolvidas, a OIT apenas pode tomar as seguintes medidas: ficar satisfeita com as informações prestadas, pedir mais informações, tentar compor uma solução com as partes divergentes ou, em último caso, enviar um assistente técnico ao Brasil para ajudar no diálogo e enviar orientações.

 

"A nossa preocupação, porém, está na imagem do país. Isso gera um ambiente de incerteza, apesar do dispositivo da reforma estar totalmente de acordo com a Constituição e com os tratados internacionais", afirma Sylvia.

 

Segundo o secretário de relações internacionais da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Antonio Lisboa, os peritos que analisaram a situação do Brasil no ano passado - a prevalência do negociado sobre o legislado e a possibilidade de negociação em contrato individual - entenderam a gravidade da situação e pediram mais informações ao governo, o que só foi fornecido agora.

 

"A argumentação do governo era de que a Lei nº 13.467 [reforma trabalhista] iria fortalecer a negociação coletiva e gerar mais empregos. Mas nada disso aconteceu", diz ele, ressaltando que houve até mesmo a edição da Medida Provisória (MP) 873, que proibiu o desconto de contribuições sindicais na folha de pagamento, o que dificultou ainda mais a atuação dos sindicatos.

 

Para Lisboa, é necessário que a OIT discuta a situação do Brasil e que existam recomendações expressas para que se altere a legislação, que está desrespeitando o que prevê a Convenção 98, ratificada pelo Brasil. Há, acrescenta o representante da CUT, centenas de acordos alterados para retirar benefícios de trabalhadores. Porém, na comissão, o objetivo é tratar do teor da lei. "Para casos específicos, podemos fazer uma denúncia no comitê de liberdade sindical. Mas agora estamos discutindo o mérito da lei."

 

Fonte: Valor Econômico