Por C. D. Carlson (People’s World)

 

“Nações cambaleiam e vacilam em seus caminhos; elas fazem erros hediondos; elas cometem erros terríveis; elas fazem coisas grandiosas e bonitas. E não devemos guiar melhor a humanidade contando a verdade sobre tudo isso, tão longe quanto a verdade seja verificável?” – W. E. B. Du Bois, Black Reconstruction in America.

No Halloween, a Suprema Corte ouviu argumentos orais sobre a questão das ações afirmativas. Baseado em questões perguntadas durante a audiência, parece provável que a corte de direita vai limitar, se não eliminar, as ações afirmativas no ensino superior. Quais são as raízes históricas das ações afirmativas, porque elas estão sob ataque pela corte, e o que nós podemos fazer?

As ações afirmativas vêm da Cláusula da 14ª Emenda de Proteção Igual e é a ideia legal de que os oprimidos devem ser tratados justamente, protegidos dos poderosos, e que seja permitido a eles construir a democracia.

A questão perante a Suprema Corte é se as faculdades podem usar a raça como um fator nas admissões. Uma grande facção da classe dominante se opõe à justiça, e usa a divisão em torno de raça para puxar eleitores para seu lado. Usando advogados e linguagem confusa, eles defendem uma versão falsa de igualdade. Eles empurram a ideia estreita e inefetiva de que todas as raças devem ser tratadas estritamente “iguais”, e que as escolas devem ignorar a história do racismo porque não é “justo” com os grupos menos explorados.

A 14ª Emenda saiu das ruínas da Guerra Civil (1861-65). Em estados rebeldes como Louisiana e Georgia, os escravizados libertaram a si mesmos. Eles entraram em greve, puseram suas ferramentas para baixo, e andaram para fora da plantação. Os autos libertados e seus aliados no Exército da União apreenderam plantações, dando aos empobrecidos os recursos para começar a construir uma nova sociedade.

Depois da Guerra Civil, pessoas autos libertadas construíram a democracia no Sul tomando o poder em seus lares, comunidades e escolas. Porque eles tinham terras e eram seus próprios chefes, eles usaram seu trabalho para enriquecer sua comunidade. Eles pagaram por coisas como o Freedmen’s Bureau, ao invés de enriquecer plantadores e donos de usinas. Esse foi o período da Reconstrução Radical.

Enquanto as pessoas construíam a democracia, o medo e a ganância dos opressores crescia em resposta. Na economia baseada na agricultura do Sul, os opressores eram os remanescentes da rapidamente em declínio classe de plantador e os capitalistas emergentes (“os aventureiros políticos”) que legalmente controlavam as terras e as ferramentas de agricultura, assim como os meios para fazer cumprir os contratos de trabalho adesivos que impunham condições severas para o trabalho livre.

A 14ª Emenda foi adotada pela União em 1868 durante esse período violento. Ela foi promulgada para proteger o crescimento da democracia entre os oprimidos, que estavam começando a mandar representantes negros para os capitólios estaduais. Naquela época, plantadores e ex-confederados estavam correndo para estabelecer governos que se opunham ao trabalho democrático dos autos libertados e se dedicavam a restaurar o governo dos plantadores supremacistas brancos. Quando o Exército da União foi prematuramente removido do Sul, a promessa de 40 acres e uma mula foi revogada, e a Klan e os chefes foram deixados livres para aterrorizar e explorar.

Os inimigos da democracia usavam a influência social de militares derrotados e amargos e líderes políticos para radicalizar massas de brancos pobres e ignorantes com propaganda antinegros. Eles culpavam escravizados libertados pelos padrões de vida reduzidos que resultaram de o Sul ter perdido a Guerra Civil. Multidões incendiaram as instituições da democracia, como as escolas e igrejas no coração da comunidade negra, e aterrorizaram e mataram o eleitorado negro. Enquanto esses grupos de trabalhadores lutavam entre si, os opressores foram capazes de usar o caos e instabilidade para baixar os salários, criar condições de escassez e militarizar a sociedade.

Nesse contexto de terrorismo, os poderosos usaram as cortes e advogados para virar a 14ª Emenda de cabeça para baixo, para ter as leis dos livros combinando com a realidade no chão. O exemplo mais alto foi Plessy v. Ferguson (1896). Nesse caso, a Suprema Corte disse que a igualdade ficcional de “separados, mas iguais” era legal. Isso deu aos estados o sinal verde para impor a segregação legal e conduzir uma separação entre brancos e negros. Esses oprimidos recém-libertados negros americanos exatamente da maneira que a 14ª Emenda deveria proibir.

Através de organização e defesa direta, as pessoas têm repetidamente pressionado contra a igualdade falsa. A Suprema Corte reagiu a essa realidade dos fatos com decisões como Brown v. Board of Ed (1954) e Loving v. Virginia (1967), que fizeram ilegal a segregação escolar e legalizaram o casamento interracial.

A igualdade falsa de “separados, mas iguais” nunca alcançou o propósito histórico da 14ª Emenda, e as pessoas têm resistido a isso desde que se tornou uma realidade legal há mais de 125 anos. Em Grutter v. Bollinger (2003), a Suprema Corte novamente reagiu a realidade dos fatos e sustentou a agora ameaçada política que permite às escolas considerar a história da opressão baseada em raça nas admissões para a faculdade.

Assim como os autos libertados agiram para adquirir uma base material para a construção da comunidade depois da Guerra Civil, para os autos libertados poderem “apreender” as salas de aula e bibliotecas para adquirir uma base material para construir a comunidade hoje. E, assim como os oponentes da liberdade usaram as cortes e advogados para enfraquecer a 14ª Emenda no passado, assim fazer os oponentes de hoje usarem as cortes e advogados para quebrar seu objetivo de igualdade real.

Os oponentes do propósito histórico da 14ª Emenda estão manipulando nosso extinto por justiça. Em uma recente análise da opinião pública da FiveThirtyEight, uma posição individual sobre as ações afirmativas foi encontrada para mudar baseada somente na redação da questão perguntada – mesmo quando a questão essencialmente perguntava a mesma coisa.

Essa reviravolta da opinião mostra o esforço da direita para costurar confusão em massa está fazendo efeito. Ela também mostra que uma parte principal do público dos EUA está vulnerável a mesma perigosa manipulação que permitiu aos inimigos da democracia dividir os trabalhadores ao longo de linhas de raça no passado. Compreender nossa história vai fornecer uma base para criar a consciência e unidade necessárias na luta de hoje pela democracia.

 

D. Carlson é advogado que defende comunidades sub-representadas e marginalizadas. 

Fonte: People´s World

Tradução: Luciana Cristina Ruy