Uma matéria publicada no site The Intercept Brasil, nesta terça (21), revela que a rede de distribuição de informações falsas e propagadoras de ódio da extrema direita é muito maior do que a operação da Polícia Federal foi capaz de identificar. Segundo a matéria, o gabinete do ódio é consequência (e não apenas a causa) “de um alinhamento de forças de articulistas e influenciadores outrora pulverizados”.
“Eu acessei o software, sem preparo psicológico prévio, e fiquei enojada e atônita por alguns dias”. Para pesquisadores que trabalham com big data e extrema direita, é normal lidar com uma quantidade imensa de dados desse tipo. Mas não é o meu caso. A sensação de ver a máquina do ódio funcionando a todo a vapor, segundo a segundo, me fez entender um pouco o que Pedro queria dizer com uma guerra sem adversário”, foi o que relatou a jornalista que assina matéria, Rosana Pinheiro-Machado.
Ela fala em “guerra sem adversário”, mencionando o que o expert em tecnologia e política, que na matéria foi chamado de Pedro (ele não quis revelar o nome) explicou: “A extrema direita ganha por W.O. (…) é como se fosse uma guerra aberta, na qual a direita vem com drone e bombardeio, e a esquerda joga um fogo de artifício para o alto para tentar demonstrar reação, sem exatamente entender que está numa guerra”.
O último monitoramento realizado por Pedro e sua equipe analisou 2.513 grupos de WhatsApp bolsonaristas, 93.886 usuários e mais de 5 milhões de mensagens conspiracionistas sobre o coronavírus compartilhadas desde fevereiro.
Para ele, as esquerdas têm uma dupla defasagem na disputa política-tecnológica: não entendeu que a grande mudança de paradigma político no século 21 foi impulsionada pela tecnologia e carece de projeto e orientação para o futuro.
Pedro afirma ainda que, a despeito dos “movimentos, mídias, ativistas, influenciadores digitais e parlamentares que se preocupam com o tema e têm grande impacto nas redes” a esquerda não chega “perto de compor estrategicamente um ecossistema de atores que se movem, mais ou menos de forma coordenada, num processo de disputa política propriamente dito”.
Isso porque a extrema direita vem se articulando nas mídias desde a virada do milênio e, neste sentido, a vitória de Bolsonaro faz parte de um projeto muito maior.
O técnico dá o exemplo da prisão de Sara Winter “que não tinha nenhuma menção no ecossistema de extrema direita” e que, após sua detenção “houve uma explosão de seu nome na rede, em uma onda de viralização de linguagem religiosa que pedia por orações por ela em mais de 1.031 grupos cheios de emojis de amém e linguagem de guerra espiritual”.
Como reações que tem surgido a este tipo de ofensiva, a matéria cita “ideias progressistas estão ganhando espaço nas redes e no mercado editorial”, e personalidades como Felipe Neto e Djamila Ribeiro. Cita também, como ponto fraco da extrema-direita, o anticientificismo de Bolsonaro, que colide com os anseios por conhecimento técnico e por democracia.
Pedro disse ao The Intercept que as mensagens de pessoas infectadas por coronavírus são um ponto importante de desestabilização: “Começaram a circular mensagens de pessoas chorando, relatando sofrimento e morte, dizendo que não era uma gripezinha”. Nada disso, contudo, impacta imediatamente a caixa de pandora bolsonarista, especialmente via WhatsApp.
A saída que ele aponta para a esquerda é “se ocupar das redes de forma mais propositiva, horizontal e articulada para formar um ecossistema inclusivo, que não fique permanentemente caçando a carteirinha de seus membros”. Isso porque “A experiência da extrema direita aponta para a formação de uma rede em que as pessoas se sentem incluídas no processo político, se sentem atores ativos e não passivos no ecossistema bolsonarista. (…) Há muito pouco disso no campo da esquerda tradicional, que usa o WhatsApp ainda de forma vertical, cadastrando números de telefone para passar informação de políticos e partidos unilateralmente. Também se disseminou a promoção de intermináveis lives, bastante explicativas do mundo e muito pouco participativas – e não raramente com a caixa de comentários do Instagram fechada. Por uma hora, o político x fala com o líder do movimento y – e há quem acredite que isso é disputa de redes. Esse é um modelo que está fadado ao fracasso”.
Fonte: The Intercept Brasil