Eduardo Bonfim da Silva, Gardênia Alves de Oliveira, Josilene Branco de Souza Sales, Patrícia Sabina Marafon
O atual cenário apresenta o quanto a intolerância e o ódio direcionados contra pretos, pardos, mulheres, indígenas, pessoas com deficiência e LGBTQIAPN+ são expressões cruéis de uma sociedade ainda marcada pelo preconceito e pela exclusão. Todas essas opressões são sustentadas por sistemas de poder que perpetuam desigualdades e contribuem para a naturalização da violência. Do mesmo modo, esta realidade também reflete nos processos e relações de trabalho e repercutem no adoecimento e nas mortes relacionadas ao trabalho.
Muitos de nós, trabalhadores e trabalhadoras, enfrentam condições insalubres, com jornadas exaustivas, expostos aos riscos físicos, químicos e psicossociais advindos de uma precarização constante e crescente do trabalho, fazendo com que percamos nosso bem maior... a Saúde!
Em vista disso, para que o conceito ampliado de saúde, evidenciado na 8ª Conferência Nacional de Saúde (1986)¹, seja de fato vivenciado nos territórios, precisamos considerar que saúde não é simplesmente ausência de doença, é muito mais que isso, é um bem-estar mental, social e político. E como canta Titãs, na música Comida (1997)²“A gente não quer só comida... A gente quer comida, diversão e arte... A gente não quer só comida... A gente quer saída para qualquer parte”.
Ainda nesse contexto, a saúde do trabalhador como campo contra hegemônico, nos permite enfrentar esse complexo panorama, considerando o saber popular, o conhecimento científico e toda legislação/normas ou instrumentos que busquem ambientes de trabalho seguros, saudáveis e decentes.
E como instigou Chico Buarque, em Construção (1971)³: “Subiu a construção como se fosse máquina. Ergueu no patamar quatro paredes sólidas. Tijolo com tijolo num desenho mágico. Seus olhos embotados de cimento e lágrima”.
É dessa maneira que várias ações nos permitem ressignificar o nosso território. Materializado nas Conferências de Saúde e na participação social, o empoderamento dos trabalhadores e das trabalhadoras garante que suas vozes sejam ouvidas nas decisões que afetam diretamente suas condições de trabalho e vida.
Como canta Gonzaguinha, na canção Sangrando (1987)⁴: “Quando eu soltar a minha voz, por favor, entenda. Que, palavra por palavra, eis aqui uma pessoa se entregando. Coração na boca, peito aberto, vou sangrando. São as lutas dessa nossa vida que eu estou cantando”.
A articulação desses saberes é uma estratégia crucial para a construção de uma cultura de saúde no trabalho, pois proporciona ao povo trabalhador a inclusão de sua vivência na construção de políticas públicas eficazes voltadas à promoção da saúde. A valorização do conhecimento empírico possibilita que as diversas narrativas sobre as condições de saúde e segurança no trabalho sejam discutidas de forma mais próxima à realidade dos trabalhadores e das trabalhadoras. Pois como diz a canção Vamos à Luta (1980) de Gonzaguinha⁵: “Eu acredito é na rapaziada. Que segue em frente e segura o rojão [...]. Eu vou à luta com essa juventude. Que não corre da raia a troco de nada”.
Dessa forma, as Conferências de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora contribuem para que a classe trabalhadora seja protagonista no debate sobre suas condições de vida e trabalho, promovendo uma abordagem mais integrada e democrática da saúde, que leva em conta tanto os saberes tradicionais quanto os avanços científicos.
Vislumbrando a realização da 5ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (5ª CNSTT), um espaço fundamental para celebrar a saúde de todas as pessoas trabalhadoras. Vamos analisar e repactuar nossas ações sobre as condições de trabalho e os impactos que a atual conjuntura têm na saúde da população trabalhadora. Como canta Seu Jorge na música Trabalhador (2007)⁶: “Está na luta, no corre-corre, no dia a dia. Marmita é fria, mas se precisa ir trabalhar. Essa rotina em toda firma começa às sete da manhã. Patrão reclama e manda embora quem atrasar. Trabalhador... Trabalhador brasileiro”.
A 5ª CNSTT representa uma oportunidade de um amplo diálogo com a participação ativa de diferentes segmentos da sociedade, incluindo sindicatos, movimentos sociais, academia e órgãos governamentais, identificando as principais demandas e os desafios enfrentados pelos trabalhadores. As vivências dos territórios se concretizarão em diretrizes e propostas a serem implementadas nos Planos Plurianuais de Saúde em cada canto do nosso país. Pois como Gonzaguinha canta, em caminhos do coração (1982)⁷: “E é tão bonito quando a gente entende...Que a gente é tanta gente onde quer que a gente vá...E é tão bonito quando a gente sente...Que nunca está sozinho por mais que pense estar”.
Ademais, a 5ª CNSTT é um momento ímpar em que se expressa as diversas narrativas desse nosso Brasil. Muitas vezes, as práticas de cuidado no ambiente de trabalho são empíricas, baseadas no conhecimento coletivo transmitido de geração em geração. Essa sabedoria é essencial para a construção de estratégias de saúde mais eficazes, pois traz à tona soluções que consideram as realidades específicas de cada categoria profissional.
O conhecimento popular nas discussões das conferências é uma forma de enriquecer o debate e garantir que as políticas públicas de saúde sejam realmente adequadas às necessidades, especificidades e à cultura dos trabalhadores. Portanto, a 5ª CNSTT, evidencia a saúde do trabalhador e da trabalhadora como um Direito Humano e se configura como um espaço essencial para a discussão e implementação de políticas públicas equânimes, inclusivas e eficazes.
As letras das músicas, que estão presentes no Documento Orientador da 5ªCNSTT, expressam os desafios que emergem no cotidiano da classe trabalhadora. E como diz a canção, de composição desconhecida: “Nossos direitos têm! Se não têm nossos direitos o Brasil perde também!”. Cantamos pela permanência dos nossos direitos e seguimos resistindo e persistindo, pois se não têm nossos direitos os trabalhadores e as trabalhadoras perdem também!
Referências
1Brasil. Conselho Nacional de Saúde. 8ª CNS – Conferência Nacional de Saúde. Relatório final. Brasília, DF: CNS; 1986.
2Titãs. Comida [música]. São Paulo: Warner Chappell, Edições Musicais Ltda; 1997.
3Buarque FC. Construção [música]. Rio de Janeiro: Philips; 1971.
4Gonzaguinha. Sangrando [música]. In: Ao Vivo. Rio de Janeiro: RCA Victor; 1987.
5Gonzaguinha. Vamos à luta [música]. In: Gonzaguinha da vida. Rio de Janeiro: RCA Victor; 1980.
6Jorge S. Trabalhador [música]. In: América Brasil. Rio de Janeiro: WEA; 2007.
7Gonzaguinha. Caminhos do coração [música]. In: Gonzaguinha canta. Rio de Janeiro: RCA; 1982.
8Quebradeiras de Coco Babaçu. "Nossos direitos vêm!" [mídia]. São Paulo: Rede Sesc de Bibliotecas; 2015. Disponível em: https://sesc.i10bibliotecas.com.br/obra/509001
Eduardo Bonfim da Silva¹, Gardênia Alves de Oliveira², Josilene Branco de Souza Sales³, Patrícia Sabina Marafon³
¹Administrador. Educador Popular em Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora. Coordenador Técnico do Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho
²Bacharel em Direito. Pesquisadora em Saúde do Trabalhador. Técnica do DIESAT
³Bacharel em Saúde Coletiva. Pesquisadora em Saúde do Trabalhador. Técnica do DIESAT
⁴Psicóloga. Pesquisadora em Saúde do Trabalhador. Técnica do DIESAT
*A Coletânea “Rumo à 5ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (CNSTT) – Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora como Direito Humano” é uma iniciativa aberta que convida a sociedade a participar da reflexão sobre os desafios da saúde no mundo do trabalho. Trabalhadores, sindicalistas, movimentos sociais, coletivos, Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest), Comissões Intersetoriais de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (Cistt), entre outros, podem enviar seus materiais, em diferentes formatos. Veja as orientações para participar.
Categoria
Saúde e Vigilância Sanitária