Com direção da doutoranda da USP Ines Buschatsky, obras serão exibidas nesta semana
A rotina de Ines Bushatsky nos últimos meses foi intensa. A doutoranda em Artes Cênicas pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP assina a direção cênica de três óperas inéditas, que serão apresentadas nesta semana no Theatro São Pedro, em São Paulo. A estreia das três peças – cada uma com cerca de 20 minutos de duração – acontece nesta quinta-feira, dia 26, às 20 horas. Depois, elas voltam a ser exibidas na sexta-feira, dia 27, no sábado, dia 28 – sempre às 20 horas -, e no domingo, dia 29, às 17 horas.
A primeira ópera a ser apresentada é Gota Tártara: Uma Ópera-Pesadelo, composta por Franciele Regina, com libreto de Sofia Boito. A história acompanha uma mãe e seu filho vivendo em uma situação de insegurança alimentar extrema. A realidade e o sonho se confundem e a mulher nunca consegue fugir do pesadelo da fome.
“Na encenação, nós escolhemos dividir o espaço da cena entre o inconsciente-pesadelo e o espaço do presente, onde ela vive a tragédia”, explica Ines. Os cenários têm simbologias opostas: um supermercado, que representa a bonança, se opõe ao espaço de dúvida e desafio sobre o que fazer diante da fome. A diretora antecipa que a ópera tem um desfecho trágico.
Em seguida, será encenada Entre-Veias: Uma Ópera de Entranhas, composta por Giovanni Porfirio, com libreto de Jaoa de Mello. Aqui um vírus ganha vida através dos diferentes cantores solistas e acompanhamos suas tentativas de comunicação com os espectadores.
“A ópera tem um movimento de corporificação, é algo que vai ganhando corpo e voz”, afirma Ines. A encenação segue a proposta do enredo de dar substância a um ser inanimado. “As materialidades da cena seguem o mesmo caminho, vão ganhando forma para trazer à tona a comunicação que o vírus quer fazer”, detalha a diretora.
Por último, será apresentada Casa Verdi: Meta-Ópera em Ato Único, de Caio Csizmar e libreto de João Crepschi. A obra recupera figuras históricas da ópera em um embate entre tradição e contemporaneidade. Grandes cantores de ópera, como Maria Callas, Renata Tebaldi, Luiza Tetrazzini e Luciano Pavarotti, são alguns dos personagens.
Cena de Gota Tártara: Uma Ópera-Pesadelo - Foto: Divulgação/Theatro São Pedro
O título dessa ópera faz alusão a um retiro para cantores aposentados criado pelo compositor italiano Giuseppe Verdi, no século 19. Antes de abrigar os cantores, a Villa Sant’Agata, no norte da Itália, era a moradia de Verdi, que determinou que os direitos autorais de suas obras fossem utilizados para a criação do retiro após a sua morte.
O local se tornou um museu com documentos pessoais, instrumentos musicais e fotografias, mas hoje está fechado por uma disputa de herdeiros. Na encenação, um teatro foi criado para representar o retiro. “Há um borrão entre lembrança e realidade, os artistas lembram as suas grandes carreiras e começam a ter devaneios”, explica Ines. Há ainda uma crítica sobre a especulação imobiliária na cidade de São Paulo, com a iminente demolição do teatro em que, na ópera, os cantores estão abrigados.
Cena de Casa Verdi: Meta-Ópera em Ato Único - Foto: Divulgação/Theatro São Pedro
“O processo da ópera é mais rápido e mais intenso, tem menos tempo para ensaios e eles acontecem todos os dias”, explica a diretora sobre a diferença entre dirigir peças operísticas e teatrais. “Eu fico em constante comunicação com o diretor musical para entender o que fica mais legal na música e na cena.” Ines já dirigiu quatro espetáculos teatrais, sendo Dr. Anti, que trata de negacionismo e da ascensão da extrema-direita ao poder, seu trabalho mais recente.
Segundo a diretora, o processo de direção cênica das óperas se inicia com o levantamento da cena, ou seja, o entendimento e a criação das ações, para depois unir o trabalho com a orquestra. Ines esclarece que a parceria com o diretor musical é fundamental para aliar o drama à música.
Giuseppe Verdi (no centro, sentado), em sua casa na Villa Sant’Ágata - Foto: domínio público
Fonte: Jornal da USP