A Diocese de Campo Limpo, no Regional Sul 1 da CNBB, informou na manhã da segunda-feira, 20, o falecimento do Padre Jaime Crowe, SPS, aos 77 anos, em decorrência de um infarto. O sacerdote irlandês estava em seu país de origem, onde retornou em definitivo em 2021, por questões de saúde, após décadas de trabalhos no Brasil.
“A Diocese de Campo Limpo agradece por todo o serviço do Padre Jaime ao Reino de Deus prestado nesta porção do Povo de Deus. Também expressa suas condolências aos familiares, amigos e aos padres da Sociedade de São Patrício”, escreveu a Diocese no comunicado sobre o falecimento.
Ainda não foram divulgados detalhes sobre o funeral e o sepultamento. Na terça-feira, 21, às 19h30, haverá uma missa em sufrágio do Padre Jaime Crowe na matriz da Paróquia Santos Mártires (Rua Luis Baldinato, 09, Jardim Sônia Regina).
Ao lado dos pobres
Pertencente à Sociedade São Patrício (SPS), Padre Jaime chegou ao Brasil 1969 e atuou em diversas localidades da Diocese de Campo Limpo, como a cidade de Embu das Artes.
Em 1986, iniciou trabalhos pastorais no Jardim Ângela, na periferia da zona Sul da cidade de São Paulo, localidade que no ano 2000 foi apontada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o lugar mais violento do mundo.
Na Paróquia Santos Mártires, no Jardim Ângela, Padre Jaime denunciou as violações de direitos humanos e a violência que ceifava a vida de inúmeros jovens da região. Também ajudou a fazer com que a comunidade paroquial se tornasse referência de ações de assistência aos mais necessitados e de empreendedorismo.
Padre Jaime criou a Sociedade Santos Mártires, uma associação civil sem fins lucrativos com a finalidade de abrigar as demandas da população do Jardim Ângela. Promoveu passeatas e inúmeras outras iniciativas para cobrar as autoridades públicas de melhores na região. Na Sociedade, cerca de 10 mil pessoas recebem assistência, com trabalhos que vão desde creches até atendimento psicológico para mulheres agredidas.
João Carlos Gonçalves, secretário geral da Força Sindical, conviveu com padre Jaime, quando morava no Campo Limpo. “Conheci padre Jaime em 1979, uma pessoa dedicada aos moradores da região. Atuava a partir da Paróquia do Jardim Ângela, e desenvolvia a Pastoral Operária na região, onde eu também atuava junto com outros companheiros e companheiras. Desenvolvia uma ação a partir do evangelho, com preocupações no mundo, como creches, moradia, posto de saúde, ônibus, tudo aquilo que faltava ao povo, padre Jaime estava junto nas reivindicações. Uma presença na zona sul que fez a diferença na defesa dos direitos dos mais pobres. Uma presença de Deus entre os necessitados.”
Reconhecimentos
O trabalho de Padre Jaime foi reconhecido por diversas instancias da sociedade civil. Ele ganhou prêmios pela sua vasta e importante contribuição na sociedade e sobretudo na diminuição da violência do Jardim Ângela.
Entre outros prêmios e reconhecimento, em 2005 recebeu o Prêmio USP de Direitos Humanos e em 2016 a Prefeitura de São Paulo concedeu-lhe o Prêmio de Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns.
Carta de Despedida
Em 31 de maio de 2021, ao se despedirem da Paróquia Santos Mártires, os Padres Jaime e Eduardo Mac Gettrick redigiram a seguinte carta:
Cem anos a serviço da Vida e da Esperança – ‘Combatemos o bom combate’
Saudamos a todos e todas, irmãos e irmãs, companheiros e companheiras, com quem partilhamos estes quase cem anos (somando os anos de Pe. Jaime e Pe. Eduardo) neste nosso querido Brasil, querida e amada São Paulo, de modo especial, a zona sul, incluindo Embu das Artes e Jardim Ângela.
“Para que todos tenham vida”
Desde os anos 70, fomos inspirados e apoiados pela liderança forte na Arquidiocese de São Paulo, do amigo Dom Paulo Evaristo Arns, Cardeal da Esperança e dos Direitos Humanos. Mas fomos desafiados pelas palavras de abertura da Conferência da Igreja da América Latina em Medellín em 1968, de realizarmos a nova páscoa – passando o povo de condições menos humanas para condições mais humanas – e, a partir daí, que encaramos a implantação e acompanhamento de Comunidades Eclesiais de Base, assumindo a Evangelização para anunciar, organizar e dar esperança à vida do povo em nome de Jesus Cristo, da Igreja e do Ser Humano. Assim procuramos viver em Espírito de Equipe tanto no Embu das Artes – Paróquia Todos os Santos – quanto no Jardim Ângela – Paróquia Santos Mártires.
“Eu te agradeço Ó Pai, Senhor do Céu e da Terra”
Por questões de idade não tendo mais a mesma energia para continuarmos no mesmo ritmo decidimos tomar outros rumos, voltando para a nossa terra Irlanda e a princípio passar um tempo com nossos familiares, também idosos.
Queremos manifestar a nossa gratidão profunda às nossas famílias que nos apoiaram tanto nestes anos. À Sociedade São Patrício que nos enviou e acompanhou, aonde soubemos viver em família, a Igreja na Arquidiocese de São Paulo, Região Episcopal, atual Diocese de Campo Limpo e de modo especial, a Forania M’Boi Mirim, que em tempos difíceis procuramos viver em comunhão e participação.
Pelas religiosas a quem dedicamos os nomes da Irmã FiIis e Irmã Agnes, dando suas vidas pela vida do povo, de modo especial os mais excluídos por tantos anos nesta região. Como também o irmão Nicolau SVD., que tanto nos ajudou.
Aos leigos e leigas que tanto fizeram e fazem! Costumamos dizer, os padres levam o nome, mas quem carrega o piano são estes leigos leigas tão dedicados que são as verdadeiras testemunhas da Ressurreição, e que hão de encontrar novos caminhos na construção do Reino pós pandemia. A todos, nossa eterna gratidão!
Pelas celebrações Eucarísticas do povo de Deus reunido, obrigado Senhor!
Pelas caminhadas: Itapecerica, Cemitério São Luiz, Romaria das Águas, obrigado Senhor!
Pelas lutas: Hospital M’Boi Mirim, Metrô Jardim Ângela, duplicação da Estr. Do M’Boi Mirim e tantas outras, obrigado Senhor! Pelos Fóruns em Defesa da Vida, de Inclusão, Educação, Fórum Social Sul, Fé e Política, Comitê Santo Dias, CDHEP, MOVA, Pastoral Operária, Pastoral da Juventude, Ubuntu, obrigado Senhor!
Pelos jogos de futebol, canastras, festas e “água benta”, e tantas outras coisas boas, por sermos Família Santos Mártires, obrigado Senhor!
Por tudo isso e muito mais, obrigado Senhor!
Nós nos despedimos reconhecendo as dores da separação, tanto para quem vai, como para quem fica, mas Deus que é Pai e Mãe, há de nos acompanhar, dar força e abençoar, quem continua nos bons propósitos e todos que continuam sendo, neste mundo de Deus e nosso, uma Chama de Esperança. Neste tempo de pandemia, querendo preservar a vida, não podemos ter despedidas com aglomerações, por isso, aceite o nosso grande abraço virtual a todos e a cada um.
E que a Mãe Aparecida continue abençoando e protegendo a todos e todas. Deus lhes pague e carregue a todos e todas na palma da sua mão, e lhes de a paz. Amém.
Saudações em Cristo, irmãos na caminhada.
É caminhando que se abre caminhos.
Padres Jaime e Eduardo.
Fonte: Com O São Paulo