O filme traz a questão: a inclinação natural da mulher é (e deve ser mantida como) a maternidade e o cuidado com a casa? Parece uma ideia ridícula, mas ela ainda está enraizada em muitas partes do senso comum e carece de constante elucidação.

 

 

 

Terra Fria conta a história de Josey Aimes, uma jovem e bela mulher que começa a trabalhar em uma mina para sustentar a família, sofre assédio sexual no trabalho e move a primeira ação de classe por assédio sexual da história.

 

Um drama dirigido por Niki Caro, baseado no livro Class Action: The Story of Lois Jenson and the Landmark Case That Changed Sexual Harassment Law, escrito por Clara Bingham e Laura Leedy Gansler, que conta a história real do processo judicial Jenson vs. Eveleth Taconite Company.

 

No início do filme as paisagens pálidas, mórbidas e estéreis prenunciam tempos difíceis. A conservadora e provinciana sociedade de Minnesota, norte dos EUA, é um cenário contraditório para o fato de a região comportar a empresa que empregou, em 1975, pela primeira vez na história, uma mulher como mineradora.

 

Contradições como estas provocaram violentos choques, como os vividos por Josey Aimes. Com dois filhos, e separada do violento marido, ela se muda para a casa dos pais e começa a trabalhar em um salão de beleza, o que não lhe dá condições de sustentar uma casa e sua família. Surge aí uma velha amiga, Glory, que sugere a ela buscar trabalho nas minas da fábrica de ferro Mesabi.

 

Josey se anima com a oportunidade de ganhar mais dinheiro, “o mesmo que seu pai ganha”, enfatiza a amiga. Este dinheiro, entretanto, sairá bastante caro para Josey em um ambiente dominado por grosserias machistas.

 

Os homens são abusivos e as mulheres vítimas silenciosas. Comentários maliciosos, brincadeiras sexuais, constrangimentos, investidas sexuais e retaliações a qualquer reclamação fazem parte do repertório do tratamento rude dispensado às mulheres pelos mineiros. Além da questão da política sexual, há também uma luta emocional que envolve as relações problemáticas de Josey com seu pai, Hank, e com seu filho adolescente, Sammy, que se constrange pela notoriedade da mãe.

 

Fica claro que o “sexismo”, ou seja, a ênfase na questão sexual e de gênero na conduta, o machismo, neste caso, está disseminado entre homens, que executam, e mulheres, que não se manifestam. Por outro lado a sensatez também é atributo dos dois gêneros. Há homens que se levantam em favor de Josey, contra o assédio sexual de outros colegas.

 

O debate de fundo é acerca do direito de a mulher exercer funções tradicionalmente designadas aos homens, como trabalhar na mina, ganhar dinheiro o suficiente para sustentar-se e a sua família e mover ações judiciais em defesa de sua classe. O filme traz a questão: a inclinação natural da mulher é (e deve ser mantida como) a maternidade e o cuidado com a casa?

 

Parece uma ideia ridícula, mas ela ainda está enraizada em muitas partes do senso comum e carece de constante elucidação. O debate sobre a mulher, assim como sobre os direitos humanos de modo geral, são recorrentes no cinema, nas artes, nos estudos acadêmicos etc.

 

A luta pelos direitos civis vai na contramão de interpretações generalistas, subjetivas, estáticas e vacilantes sobre o papel e o lugar de cada um. Civil de civilidade, de civilização, é um conceito que se apoia justamente na evolução humana e na capacidade que as pessoas têm de se superar, de conviver socialmente de forma justa, o mais construtivamente possível.

 

 

 

Terra Fria (North Country)

 

EUA, 2005

Direção: Niki Caro

Elenco: Charlize Theron, Thomas Curtis, Frances McDormand, Sean Bean

 

 

Por Carolina Maria Ruy