Especialista sugere que o banhista fique atento às regiões que já foram afetadas e as evite. Levantamento do governo contabiliza mil locais atingidos.

O óleo que chegou à costa brasileira no fim de agosto e, até o momento, já atingiu quase mil locais não fez com que os turistas desistissem de visitar os 11 estados afetados neste fim de ano. Segundo a Abav (Associação Brasileira de Agências de Viagens), o Nordeste foi o destino mais procurado pelos brasileiros em dezembro. Acontece que as manchas continuam sendo encontradas em algumas localidades e, apesar do otimismo do governo, com a retórica de que está tudo sob controle, especialistas ponderam a necessidade de alguns cuidados na hora de escolher a praia para a diversão. 

A Marinha e o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) destacam em seus sites que é possível saber se uma praia está ou não própria para banho conferindo o monitoramento de balneabilidade. Este, no entanto, está longe de ser um método confiável para saber se o local pode ou não conter óleo, conforme pesquisadores ouvidos pelo HuffPost.

A balneabilidade é determinada a partir da quantidade de coliformes presentes na água. Para saber sobre o óleo, explica o professor do departamento de Ciências Biológicas da UPE (Universidade de Pernambuco) Clemente Coelho Júnior - que é biólogo e oceanógrafo -, é necessária uma análise de hidrocarbonetos - componentes altamente tóxicos presentes no petróleo que atinge o litoral. “A balneabilidade tem a ver com contaminação por efluentes orgânicos, desde coliformes fecais a nutrientes que estão no esgoto. São poucos os laboratórios que fazem essa análise de hidrocarbonetos. Existe uma diferença gigantesca”, afirma. 

O HuffPost questionou o Grupo de Acompanhamento e Avaliação (GAA), composto pela Marinha, Ibama e ANP (Agência Nacional do Petróleo), sobre o motivo de orientar a busca pela balneabilidade. Até o fechamento desta reportagem, porém, não obteve resposta. 

Clemente lembrou que em Pernambuco, por exemplo, houve apenas uma análise até o momento da qualidade da água. “O material foi coletado onde? Provavelmente em áreas de ondas e grandes marés”, destacou, comentando o resultado negativo para contaminação, mas frisou: “Não houve uma análise, como a academia ainda quer responder, sistematizada, em que se escolhe um período para fazer repetições, para se ter um panorama”.

Como saber onde ir? 

Coordenador do movimento Salve Maracaípe, Daniel Galvão diz que a resposta oficial a todos que procuram a ONG em busca deste tipo de informação é “observar os boletins dos órgãos ambientais”.

Ele, contudo, sugere que o banhista fique atento aos locais que já foram afetados e os evite. “Por mais que não se veja o óleo, ele pode estar presente em forma de gases e moléculas, em especial nos locais mais afetados”. Ele mencionou, por exemplo, a bacia do porto de Suape, em Pernambuco, e a praia do Forte, na Bahia. 

Galvão também deu como exemplo a praia de Itapuama, em Pernambuco, na região de Cabo de Santo Agostinho, um dos locais mais afetados pelo óleo em meados de outubro. “A estrutura da praia ali é de formação de pedras e o óleo chegou a todos os ambientes. Ali, com 99% de certeza, eu diria que o ambiente está contaminado. Eu mesmo só vou lá pro inverno, a depender”, diz. 

Para o oceonógrafo Clemente Coelho, porém, a possibilidade de a água estar contaminada é mínima. “No Nordeste, especialmente, há uma dinâmica forte, com marés enormes, e a água se renova muito rapidamente. Em áreas mais confinadas, praias de rios, estuários, aí sim, é melhor tem mais cuidado”, afirma. 

No site do Ibama, há uma página específica com o monitoramento dos locais atingidos feito pelo órgão. Desde meados de dezembro, a atualização não é mais diária, mas sim, semanal. O último boletim, atualizado na sexta (3), mostra que já são quase mil locais atingidos pelo petróleo. 

O banhista pode também buscar se atualizar sobre a situação no órgão ambiental local, seja estadual, seja do município. 

É seguro comer peixe? 

O Ministério da Agricultura já divulgou duas pesquisas nas quais destaca que os pescados estão próprios para consumo. A primeira, feita pela PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), e a segunda, pelo Laboratório Federal de Defesa Agropecuária em Santa Catarina. Acontece, que as amostras analisadas - 68 ao todo - foram coletadas em estabelecimentos sob Inspeção Federal, o que significa que os pescados artesanais não foram analisados ainda pela pasta.

Como afirmou à época o responsável pela análise da PUC, o professor Renato Carreira, o tipo de amostras enviadas pelo governo não permite afirmar que os peixes estão, todos, aptos ao consumo. 

O governo de Pernambuco também enviou peixes e crustáceos para análise da PUC-RJ - neste caso, aqueles advindos da pesca artesanal. Amostras de xaréu e sapuruna coletadas próximo à Ilha de Itamaracá (PE) foram reprovadas. A maioria dos pescados analisados, no entanto, foi considerada própria para consumo.

Daniel Galvão, que é engenheiro de pesca e mestre em oceanografia, lembra que os peixes são “seres migratórios” e, ainda que tenham sido pescados em uma região pouco ou não atingida pelas manchas de óleo, podem ter saído de um local afetado. 

“O País não tem uma agência ambiental forte que o governo federal deveria estar encabeçando e fazendo análise de tempos em tempos. Mas vale sempre a pena ficar de olho em novos estudos”, destaca. 

A ressalva do professor Clemente é para o fato de “a limpeza nunca conseguir ser 100%”. “Os fragmentos minúsculos estão presentes até hoje. E as pequenas manchas, não as grandes, têm reaparecido”, avaliou. Ele aconselha, como Galvão, a ficar de olho nos resultados apresentados pelo governo. 

De acordo com outros especialistas ouvidos pelo HuffPost no segundo semestre de 2019, será necessário um monitoramento do litoral brasileiro por pelo menos 20 anos após a tragédia ambiental, já considerada a maior vivida pelo País até hoje.

Fonte: https://www.huffpostbrasil.com/