Brasília – Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver em Brasília, reúne mulheres de todos os estados e regiões do Brasil (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

Nesse especial do Novembro Negro, a Agenda Arte e Cultura relembra acontecimentos que foram importantes na tomada de direitos à população Negra. São eles atos políticos e culturais, que ainda que recentes já contribuem para a mudança no arranjo da população brasileira em busca de igualdade. Todos os acontecimentos também podem ser acompanhados toda sexta-feira do mês de novembro nos Stories do perfil da Agenda Arte e Cultura no Instagram.

Marcha Zumbi dos Palmares

No dia 20 de novembro de 1995, cerca de 30 mil pessoas se reuniram, em Brasília, na Marcha Zumbi dos Palmares. Neste ano, celebravam 300 anos da morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, o maior do período colonial. Na marcha as pessoas foram às ruas para dar visibilidade às mazelas da população negra e protestar por políticas públicas de equidade.

O movimento, nomeado como “Marcha Contra o Racismo pela Igualdade e a Vida”, foi uma iniciativa do Movimento Negro, e denunciou a inexistência de amparo legal às práticas discriminatórias. Em seu manifesto, eles retrataram como essa ausência possibilita a reprodução dos preconceitos. O movimento também denunciou índices da educação, saúde e violência para comprovar que a população negra é mais vulnerável.

O significado da marcha de 1995 é um marco para a definição de recursos da união explícitamente para superar as desigualdades raciais. Na época, o então presidente Fernando Henrique Cardoso assinou o decreto que instituiu o Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra. A Marcha Zumbi dos Palmares continua acontecendo todo ano no dia 20 de novembro, data que em 2003 foi estabelecida pela lei como Dia da Consciência Negra. O dia 20 de novembro é feriado em mais de mil cidades do Brasil, mas não é feriado em Salvador.

Lei de obrigatoriedade do estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena

Em 2003, o presidente Lula da Silva assinou a lei 10.639/03 que tornou obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares. Somente em 2008 há modificação para a lei 11.645/08 tornando-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.

Essa lei estabelece as diretrizes e bases da educação nacional e, apenas recentemente, foi incluído no currículo oficial da rede de ensino essa condição de obrigatoriedade temática. Assim, por meio da lei 11.645/08, fica estabelecido que deverá ser ensinado o estudo da história da África e dos africanos e a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil.

A medida legal é importante para guiar as novas formas de representar o negro na sociedade brasileira porque valoriza sua cultura e contribuição para a formação do Brasil, como afirma o artigo 1°. “É obrigatório o ensino da cultura negra e indígena resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil”.

Lei da Cotas

Foi também pensando em educação e em ocupar espaços, que foi criada em 2012 a lei nº 12.711, conhecida como a Lei de Cotas. Através dela, as instituições de ensino superior federais e particulares devem seguir especificações nos seus processos seletivos para estudantes afrodescendentes. Posteriormente, em 2016, foi expandido o sistema de cotas para estudantes oriundos de escolas públicas.

A lei entrou em vigor imediatamente após sua aprovação. Segundo estudo recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), nos últimos 15 anos houve um aumento gradual da inserção de negros nas Universidades. A Lei de Cotas uniformizou as vagas destinadas aos afro-brasileiros, estabeleceu metas de aumento – para início e fim do programa -, além de tornar obrigatória a adoção desse e outros programas de ações afirmativas nas universidades federais.

A UFBA é a universidade com mais diversidade cultural nesse sentido, pois aderiu ao sistema de cotas 15 anos antes de sua obrigatoriedade.

75,6% dos alunos da UFBA se declaram pretos, pardos ou indígenas, muito acima da média nacional que é de 51,2%, segundo dados da V Pesquisa Nacional de Perfil dos Graduandos das IFES 2018, realizada pela Andifes.

Os resultados da pesquisa ainda chamam atenção sobre os alunos com vulnerabilidade socioeconômica, 69,1% dos estudantes da UFBA têm renda de até 1,5 salário mínimo. Esses resultados apontam às novas necessidades do ensino superior, projetos que viabilizem assistência estudantil ou seja a permanência dos estudantes na universidade.

Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver

“Quem tem medo do feminismo negro”? A frase é título do livro da filósofa, feminista e acadêmica brasileira Djamila Ribeiro. Entender a mulher negra hoje é enxergar que os seus obstáculos se apresentam pela interseccionalidade, ou seja, vários sistemas de opressão se sobrepondo, como gênero, raça e classe social. As necessidades das mulheres negras são únicas e foram a reivindicação do protesto em 2015, a Marcha das Mulheres Negras contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver.

A manifestação ocorreu no dia 18 de novembro. Cerca de 50 mil mulheres ocuparam o Eixo Monumental em Brasília, região da Esplanada dos Ministérios, além de marchas realizadas em outras cidades do país. No manifesto da Marcha, as mulheres deixam explícito como sofrem com a invisibilidade de suas necessidades, apesar de serem uma parcela significativa da sociedade.

“Somos 49 milhões de mulheres negras, isto é, 25% da população brasileira. Vivenciamos a face mais perversa do racismo e do sexismo por sermos negras e mulheres”.

Essa marcha continua sendo realizada anualmente, a Bahia é um dos estados que o movimento negro feminista se manteve organizado. Segundo o Atlas da Violência os dados no recorte entre 2007 e 2017 de violência contra a mulher aumentou em 20,7%. O número de homicídios de mulheres negras cresceu mais de 60% em uma década, em comparação com um crescimento de 1,7% nos assassinatos de mulheres não negras.

Marcha do Empoderamento Crespo

Ainda sobre essa disposição efervescente de pensar o lugar da mulher negra na sociedade brasileira, no dia 7 de novembro de 2015 aconteceu em Salvador a primeira Marcha do Empoderamento Crespo. Estética é política, e essa Marcha reivindicava à visibilidade e liberdade dos corpos negros. Exigindo o respeito à diversidade cultural e estética negra.

O início da organização foi pela internet, nesse momento viralizou nas redes sociais o desafio da transição capilar, processo de abandono da química que alisa os cabelos. Hoje o grupo do Facebook possui cerca de 13 mil participantes. A estudante de design da UFBA Amanda Braga participou da marcha na sua primeira edição e para ela, que estava nesse processo de aceitação do cabelo cacheado, defende o quanto foi importante ver um movimento que a representava.

“No mês que teve a marcha fazia um mês que eu não usava química no cabelo, nesse sentido da autoestima foi muito importante porque eu me vi cercada de pessoas parecidas comigo. Isso foi decisivo no processo de voltar a amar os meus cabelos. Quando você é uma pessoa negra e passa por esse processo de alisar os cabelos, tem muito a ver com você só encontrar essa representação de beleza nos espaços em evidência”, conta Amanda.

A marcha desse ano está marcada para o último sábado do mês (30), na praça do Campo Grande. Essa quinta edição tem como tema “A Força do Empoderamento Crespo – Meia Década de Ancestralidade, Continuidade e Luta!”.

FONTE: https://www.geledes.org.br/