Crenças de matriz africana concentram mais denúncias de discriminação do que outras religiões

 

 

O Brasil chega a este 21 de janeiro, Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, com números alarmantes. Segundo levantamento da startup JusRacial, em 2023 havia 176 mil processos por racismo em tramitação nos tribunais do país, e um terço deles (33%) envolviam intolerância religiosa.

A pesquisa foi feita a partir das páginas oficiais dos tribunais durante todo o ano, contando processos concluídos ou em andamento. No Supremo Tribunal Federal (STF), a proporção de casos de intolerância religiosa entre os processos por racismo é ainda maior: 43%.

Em entrevista ao Central do Brasil, programa do Brasil de Fato em parceria com a Rede TVT, o diretor-executivo da JusRacial, Hédio Silva Júnior, advogado e doutor em direito pela PUC-SP e ex-secretário de Justiça do Estado de São Paulo, afirma que pessoas de diferentes segmentos religiosos ou convicções filosóficas enfrentam preconceitos no Brasil devido às suas crenças. Entre os praticantes de religiões afro-brasileiras, porém, esse índice é muito maior.

"Os dados refletem, primeiro, esse problema gravíssimo, que não está ainda merecendo a devida atenção por parte das autoridades públicas, que é o problema do discurso de ódio, que nasce no Brasil há cerca de 40 anos com as denominações neopentecostais, com a satanização de todo legado civilizatório africano. Tudo que diz respeito à presença negra no Brasil: o samba, o carnaval, o maracatu, acarajé, é satanizado diariamente, juntamente com a religiosidade de matriz africana, que é muito popular no Brasil", pontuou. 

A pesquisa revelou um aumento de nada menos que 17.000% nos processos por racismo nos tribunais brasileiros na comparação com 2009, quando foi feita comparação semelhante. Hédio Silva Júnior afirmou que o discurso de ódio ganhou muito espaço no país nos últimos anos, e teve interferência direta na eleição de Jair Bolsonaro (PL) para a presidência da República em 2018 – tendo avançado ainda mais durante os quatro anos de mandato da extrema-direita na Presidência.

O especialista destacou que é possível afirmar que os casos estão subnotificados, e que o número de processos por racismo e por intolerância religiosa, embora sejam altos, não reflitam de fato a frequência com que esses crimes são praticados no país. 

"O discurso de ódio explica a violência simbólica, a ofensa, a humilhação, o ultraje, os ataques aos templos, a expulsão de sacerdotes de matriz africana de seus terreiros. E, lamentavelmente, se o Brasil não se der conta da gravidade disso, eu temo muito que, no curto prazo, poderemos ter um esgarçamento do tecido social brasileiro em razão do discurso de ódio e da intolerância religiosa", alertou.

 

Fonte: Brasil de Fato