O inciso XIII do artigo 7º da Constituição não proíbe a jornada de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso. O dispositivo apenas estabelece que a jornada de oito horas diárias ou 44 horas semanais pode ser relativizada mediante compensação, conforme acordo ou negociação coletiva. No modelo 12 x 36, as quatro horas a mais de jornada diária são compensadas por uma quantidade maior de horas consecutivas de descanso.

Com esse entendimento, o Plenário do Supremo Tribunal Federal validou o artigo 59-A da CLT, introduzido pela reforma trabalhista de 2017, que autoriza a adoção da jornada 12 x 36 por meio de acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo. O julgamento virtual se encerrou na última sexta-feira (30/6).

A Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) contestou a regra por meio de ação direta de inconstitucionalidade. Segundo a entidade, o dispositivo da reforma violou o inciso XIII do artigo 7º da Constituição, que não menciona a possibilidade de acordo individual. A autora também argumentou que a adoção de uma jornada ininterrupta não poderia ser pactuada sem a intervenção dos sindicatos.

 

Nada anormal

A maioria do colegiado seguiu o voto do ministro Gilmar Mendes. Ele considerou "natural" que a reforma normatizasse a jornada 12 x 36 na CLT e permitisse sua adoção via contrato individual, "com base na liberdade do trabalhador".

O magistrado lembrou que tal modelo já era amplamente aceito na jurisprudência. Antes da reforma, a Súmula 444 do Tribunal Superior do Trabalho validava a jornada 12 x 36 de forma excepcional, caso prevista em lei ou ajustada em negociação coletiva. Além disso, o STF já permitiu a estipulação dessa jornada para bombeiros civis.

"Não vejo qualquer inconstitucionalidade em lei que passa a possibilitar que o empregado e o empregador, por contrato individual, estipulem jornada de trabalho já amplamente utilizada entre nós, reconhecida na jurisprudência e adotada por leis específicas para determinadas carreiras", assinalou o ministro.

 

Objetivo da reforma

Para Gilmar, "as diversas alterações propostas pela reforma trabalhista empreendem um reencontro do Direito do Trabalho com suas origens privadas, fazendo com que a autonomia assuma posição de destaque, sem prejuízo, logicamente, da tutela da dignidade humana".

O ministro ressaltou que a reforma foi a resposta encontrada pelo Congresso "para proceder à composição entre a proteção do trabalho e a preservação da livre iniciativa", dentro do "exercício de sua discricionariedade epistêmica e estrutural".

A ideia dos autores da reforma foi garantir uma maior flexibilidade às contratações, para tentar reduzir a taxa de desemprego. De acordo com o magistrado, o artigo 7º da Constituição "não tem vida própria", pois "depende do seu suporte fático: o trabalho". Ou seja, "sem trabalho, não há falar-se em direito ou garantia trabalhista" e "tudo isso estará fadado ao esvaziamento".

O voto de Gilmar foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Kassio Nunes Marques, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia.

 

Entendimento vencido

O ministro Marco Aurélio, relator do caso, depositou seu voto antes de sua aposentadoria, ocorrida em 2021. Ele considerou inconstitucional a possibilidade de adoção da jornada 12 x 36 por meio de acordo individual. Os ministros Luiz Edson Fachin e Rosa Weber o acompanharam.

Marco Aurélio ressaltou que a Constituição permite a compensação de horários e a redução da jornada de oito horas diárias mediante acordo ou convenção coletiva, mas "não contempla o acordo individual".

Para ele, "o menosprezo aos ditames constitucionais foi grande", pois "a reforma trabalhista potencializou o fim em detrimento do meio, colocando em segundo plano comezinha noção de Direito".

 

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ADI 5.994

 
Fonte: ConJur