Os resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e também do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) em 2021, divulgados na sexta-feira (16), mostram que o Brasil registrou uma piora no aprendizado de estudantes nos níveis que foram avaliados, mas as perdas ficaram abaixo do que era alardeado por organizações do setor de educação com base empresarial.

A análise é do professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Daniel Cara. Em entrevista à edição desta segunda (19) do Jornal Brasil Atual, o educador garantiu que os dados comprovam que as perdas de aprendizado na pandemia de covid-19 são reversíveis. Cara pondera, contudo, que tanto o Saeb como o Ideb são limitados e precisam de aperfeiçoamentos. E por conta disso os resultados precisam ser interpretados com cautela. 

No Saeb, por exemplo, que é uma prova de português e matemática, aplicada a cada dois anos para os alunos do 2º, 5º e 9º ano do ensino fundamental e do 3º ano do ensino médio, das escolas públicas e privadas, um dos destaques foi o aumento de estudantes com níveis de alfabetização abaixo do esperado para a idade no 2º ano do ensino fundamental. A proporção dobrou, passando de 15,5%, em 2019, para 33,8%, no ano passado. O resultado nesta etapa foi atribuído por especialistas ao fechamento das escolas e às dificuldades de acesso dos alunos ao ensino remoto. 

Dados do Saeb e Ideb

Além disso, a prova do Saeb, que quase não foi aplicada pelo governo de Jair Bolsonaro (PL) sob a alegação de falta de orçamento e de ser “arriscado” realizá-la devido à pandemia, acabou sendo aplicada entre novembro e dezembro de 2021, quando muitas escolas ainda não haviam voltado ao ensino presencial, o que foi visto como uma limitação.

Por outro lado, os dados também mostram que o impacto da pandemia foi menor entre os estudantes do 5º e 9º ano, e do ensino médio, com ligeiras quedas nas notas tanto de Língua Portuguesa como de Matemática. Já segundo o Ideb, apesar da queda na aprendizagem entre 2019 e 2021, o índice de educação se manteve estável nas três etapas de ensino. A taxa de aprovação nos anos finais do ensino fundamental no ano passado ficou em 95,2%. Antes da pandemia, em 2019, o índice havia sido de 88,6%%.

Com isso, o resultado do Ideb foi de 5,9 em 2019 para 5,8 em 2021, nos anos iniciais. E de 4,9 para 5,1 no mesmo período dos anos finais. O ensino médio manteve o índice de 4,2. O Ideb leva em conta o desempenho dos estudantes no Saeb e as taxas de aprovação escolar.  Nesse caso, a ponderação é que o resultado pode não ter sido próximo da realidade devido a uma resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) que, ainda no primeiro ano de pandemia, permitiu que muitas redes de ensino pudessem aprovar automaticamente os alunos, o que foi adotado por grande parte dos estados e pode distorcer os dados. 

Empenho dos professores

De toda forma, o educador Daniel Cara explica que o resultado também mostra o empenho dos professores, em especial das escolas públicas, com a educação em meio à crise sanitária.  “O caos não está estabelecido”, afirma. “Graças aos professores isso não foi possível, porque a área da educação, embora eu não goste dessa palavra, foi muito resiliente”.

“Ela tem uma capacidade muito grande de responder à adversidade e aí tem um motivo até complexo, porque a adversidade é a regra na educação. Infelizmente os professores com ou sem pandemia, eles estão acostumados a tirar leite de pedra e mais uma vez fizeram um trabalho hercúleo. Agora é preciso investir o necessário, valorizar os professores para que a gente rapidamente recupere as perdas de aprendizado que ocorreram”, adverte o educador. 

Omissão dos gestores

Daniel Cara também comenta que o fechamento das escolas era necessário por conta da pandemia. O país tem hoje uma média de 40 milhões de estudantes em contato com a maior parte da população brasileira, ou 120 milhões. Apenas 80 milhões não teriam contato direto com esses estudantes. De acordo com o educador, o que de fato prejudicou o ensino foi a omissão do governo Bolsonaro e da esmagadora maioria de gestores estaduais e municipais. “Na prática, eles lançaram a responsabilidade para os professores”, observa. 

“Porque o que aconteceu é que também diante de todo o impacto da pandemia, muitos gestores aproveitaram aquele momento para praticarem malfeitos. E o resultado concreto é que se não fossem os professores, teríamos um resultado realmente alarmante. O Sistema Único de Saúde (SUS) foi fundamental, mas também a educação pública brasileira foi fundamental”, conclui Daniel Cara. 

 

Fonte: Rede Brasil Atual