Só vai penalizar a juventude trabalhadora pobre das periferias brasileiras, sobretudo a sua porção negra
No dia 17 de junho a comissão especial da Câmara dos Deputados aprovou o projeto de redução da maioridade penal no Brasil. Os Deputados providenciaram forte proteção policial para "protegê-los" dos manifestantes.
À frente da aprovação estão as chamadas bancadas da bala e a evangélica, assim como o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que está causando retrocessos à democracia no Brasil e aos direitos trabalhistas ao encaminhar projetos que significam grandes retrocessos às conquistas de anos de luta da classe trabalhadora, dos movimentos sociais e da sociedade civil.
Agora o projeto está pronto para ser votado no plenário da Câmara, o que deve ocorrer no próximo dia 30 de junho.
A proposta de redução da maioridade penal dos atuais 18 para 16 anos encontra apoio na população. Sobretudo entre os mais pobres. E é também fato que essa discussão se dá num contexto de extrema violência urbana que atinge, principalmente, os mais pobres. Mas será que essa é a solução para conter a chamada criminalidade?
Estudo do IPEA mostra a realidade
O Ipea (Instituto de Pesquisas Econômica Aplicadas) divulgou recentemente o estudo "O Adolescente em Conflito com a Lei e o Debate sobre a Redução da Maioridade Penal", dos pesquisadores Enid Rocha Andrade Silva e Raissa Menezes de Oliveira.
Nesse estudo, tomando como base a situação dos jovens de 12 a 17 anos com informações da PNAD (Pesquisa Nacional de Domicílios) de 2013, chegam à conclusão de que o Estado faz vistas grossas para a juventude brasileira. E não é em relação à impunidade.
A situação dos jovens no Brasil
O país conta com 21 milhões de jovens e adolescentes, 11% do total da população brasileira. A maior parte concentrada na região Sudeste (38,7%) e Nordeste (30,4%). Desses, quase 60% são negros. E qual a situação desses jovens? Pegando os jovens de 15 a 17 anos, mais de 1 milhão não tinham trabalho e não estudavam. Desses, quase 65% eram negros. Desse montante de jovens que não trabalham nem estudam, 83%, a grande maioria, são classificados como extremamente pobres e vivem em famílias com renda per capta que não chega a um salário mínimo.
Se os jovens brasileiros convivem com o desemprego e a precarização, quando o assunto é violência esses números são piores. Pegando a PNAD de 2009, vê-se que 1,6% da população já foi vítima de algum tipo de agressão. Entre os adolescentes, essa proporção vai para 1,9%. Desses, 60% são negros. Dos adolescentes agredidos, 2,8% dos brancos foi vítima de um policial ou agente de segurança privado. Já entre os adolescentes negros 4% já apanharam da polícia ou de segurança.
Já os números do Mapa da Violência de 2013 são mais dramáticos. Em 30 anos, as mortes por armas de fogo, por exemplo, cresceram 346%. Mas nos casos dos jovens, esse crescimento foi de 414%. Aqui também a juventude negra aparece mais exposta, com 133% a mais de mortes do que brancos.
Os menores infratores
A juventude negra é a maior vítima da violência de uma sociedade que a exclui e a relega ao desemprego e ao subemprego. Neste contexto, o que dizer dos chamados menores infratores? Não contribuiriam pra essa violência como tanto parecem fazer crer os conservadores e reacionários de várias colorações? Um dado já bastante divulgado é o da Unicef Brasil que mostra que, dos 21 milhões de adolescentes do Brasil, menos de um por cento (0,013%) cometeu algum crime contra a vida.
Dos adolescentes detidos no Brasil em 2013, quase 40% haviam sido presos por roubo. A segunda causa das "prisões" de adolescentes e jovens no Brasil é tráfico, com 23,5%. Homicídio aparece só em terceiro lugar, com menos de 10% das causas de internação (8,75%). Latrocínio, roubo seguido de morte, responde por apenas 1,95% das detenções. E esses jovens que mataram não se beneficiam de um sistema injusto que, sob o manto da proteção dos jovens e adolescentes, promove a impunidade, como dizem os Bolsonaros, Datenas e Malafaias e todo o coro conservador.
Segundo o estudo citado pelo relatório do Ipea, comparando o sistema socioeducacional para jovens e o penal para os adultos, é mais fácil um jovem ou adolescente cumprir uma pena de três anos em regime fechado que um criminoso adulto. Pra um adulto ficar três anos na cadeia ele precisa ser condenado a, pelo menos, 18 anos de prisão, caso bem raro.
O quadro é o seguinte: enquanto jovens são vítimas preferenciais da violência, respondem à extrema minoria dos crimes praticados. Desses crimes, uma minoria ainda mais ínfima é formado por homicídios. E, uma vez detidos, ficam mais tempo presos que os adultos. E a maioria, 60% são negros.
Os dados levantados pelo Ipea e demais pesquisas comprovam que a causa da violência não vem de uma suposta impunidade a menores infratores. Revelam que, ao contrário, os jovens, e principalmente os jovens negros e pobres, são vítimas dessa violência.
Ao contrário do que se pode pensar, essa medida não vai não reduzir a violência. E vai ajudar a legitimar ainda mais o genocídio da juventude negra e pobre. Encontra apoio popular porque é uma resposta aparentemente fácil a um problema concreto. Mas quando os deputados aprovam isso, não estão pensando em playboys que atropelam ciclistas pobres e fogem, nem em seus próprios filhos ou familiares. Há uma imagem bem definida em suas cabeças: e essa imagem é de um adolescente negro na favela ou na periferia. É contra eles que apontam suas armas.
Verdadeira impunidade
Enquanto isso, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) citado na Operação Lava Jato e respondendo a crimes que preencheriam metros de ficha corrida, continua impune. Renan Calheiros (PDMB-AL), outro notável corrupto, continua impune e, eventualmente, até ocupando a cadeira de presidente, já que é o chefe do Senado e substitui Dilma quando esta e o vice estão fora. Enquanto isso, os "donos" do Congresso Nacional gozam de todos os privilégios possíveis e tramam a construção de um shopping para atendê-los que vai custar R$ 1 bilhão.