No verão de 2015, Angela Merkel tomou uma das mais importantes decisões do seu longo período como líder do governo alemão: permitir que centenas de milhares de refugiados entrassem no país. Apenas naquele ano, foram quase um milhão de solicitações de refúgio.
No início, eram diversas as iniciativas desenvolvidas para amparar aqueles que chegavam, mas passados seis anos, o número foi diminuindo. A Jobs 4 Refugees é uma das poucas organizações que ainda atuam exclusivamente para facilitar o encontro entre solicitantes de refúgio e potenciais empregadores.
A iniciativa se insere em um contexto amplo de integração. Entre sair de países imersos em conflitos e sentir-se em casa em outro, contudo, existem barreiras dificilmente transpostas no curso de uma vida. Como referência, pela definição do governo alemão, a condição de imigrante (migrationshintergrund) só é desfeita na geração nascida no novo país, de pais nacionais. A condição de estrangeiro é vitalícia e estende-se entre gerações.
O trabalho oferece um caminho importante para lidar com essa situação. Além de proporcionar meios para a subsistência, contribui para a autoestima, reconstrução da identidade e confere uma esperança de futuro. Essas são as crenças que motivam o trabalho de Franziska Hirschelmann, diretora de operações da Jobs 4 Refugees.
Na folha branca, pautada por pontinhos cinzentos onde anoto a entrevista, desenho com a ajuda de Franziska um gráfico para representar o nível de satisfação dos refugiados recém empregados. A linha sobe no momento em que encontram um novo trabalho, permanece estável em um breve planalto durante alguns meses até que despenca outra vez. O conflito entre o emprego e a família é uma das grandes fontes de insatisfação. O trabalho costuma aprofundar a separação tanto com os familiares geograficamente distantes, como com aqueles com quem dividem o lar.
O ponto mais visível da intervenção da Jobs 4 Refugees é a inserção no mercado de trabalho, elaboração de currículo, busca por uma vaga e a preparação para as entrevistas, mas tudo isso é apenas o início. Franziska conta que eles não podem se dar ao luxo de serem apenas uma agência de empregos.
Mesmo depois das contratações, eles mantêm o contato, procurando facilitar o diálogo com as empresas. Franziska conta de um caso que ajudou a solucionar em que o empregador era uma grande rede varejista. Os refugiados estavam sendo alocados para uma área onde trabalhavam majoritariamente funcionários de um país do leste europeu, que falavam apenas sua própria língua materna. Depois de um imenso esforço para aprender alemão, os refugiados se viam obrigados a lidar novamente com a barreira de uma língua estrangeira. A solução foi alocá-los para um novo departamento da empresa.
Outra questão é financeira. Após serem contratados, a maioria dos refugiados passa a receber um pequeno salário dos seus empregadores. Um valor que é apenas marginalmente superior ao auxílio antes recebido do Estado. Junto desse aumento, vêm uma série de obrigações diárias com implicações financeiras, como o transporte e a alimentação. O custo adicional faz com que o saldo ao final do mês não seja muito diferente daquele anterior à obtenção de um emprego. Mesmo sendo uma transição necessária, a situação pode gerar frustrações.
Esses elementos ressaltam a necessidade de um acompanhamento da Jobs 4 Refugees. No site da organização vemos fotos de casos bem-sucedidos, como de Shinwari, Aya ou Elavisa que encontraram oportunidades no crescente setor de tecnologia. Reforçando a ideia de continuidade, posts nas redes sociais celebram o aniversário de seis meses de alguns deles no novo emprego.
Em um estudo de caso elaborado sobre a Jobs 4 Refugees, a organização é descrita na forma de uma ponte entre refugiados e empregos. Se por um lado a metáfora é útil ao traduzir a ideia de conexão - e ainda o sentido mais literal de união entre porções de terra divididas pela água - ela é imprecisa ao sugerir que o percurso tem um começo e fim. Terminada a entrevista com Franziska, tenho a impressão de que a ponte é essencial, mas infinita.
Por TOMAS ROSENFELD - UOL